sexta-feira, 15 de junho de 2018

VELHA? QUE NADA!


     Tal qual os vinhos, ficamos melhores com o tempo. As safras mais antigas são os melhores. Quando perguntassem nossa idade, seria apropriado respondermos "sou da safra 1950 ... 1960...1970", e nessa linha damos a oportunidade aos curiosos de esquecerem o rótulo e perceberem que foi o decurso do tempo o que nos tornou saborosas, perfumadas, bem coradas, especiais, valiosas e com densas lágrimas.
     Pra quem não gosta de vinhos, podemos usar outro parâmetro de comparação: os livros. É certo que ficam cada vez melhores após sucessivas edições. A última é sempre mais rica que as anteriores, mais recheada de histórias e com mais lições a compartilhar. E do mesmo modo como os vinhos, ao sermos indagadas sobre os anos que temos, responderíamos "estou na 55a edição", "na 65a edição"... . Não são as capas atrativas que expressam a qualidade do conteúdo, porque aparência não é essência. Também não são zilhões de plásticas ou truques estéticos que modificam alguém. O que importa mesmo é o conteúdo, ainda que essa afirmação pareça representar um baita chavão, clichê ou ideia comum.
     Ora, mas se o paralelo com livros também não convence, então pega o sábio, vai dar na mesma. Em nosso imaginário, o sábio nunca é um infante, mas um velho de longas barbas, já calejado de tanto caminhar. A riqueza do seu conhecimento e sabedoria é fruto da observação lenta das coisas.
     Tem ainda os instrumentos musicais. Quanto mais tocados melhores ficam, porque já levaram muito sopro, dedilhada e cutucada. Quanto mais participação em orquestras, mais experientes e preciosos. Quanto mais afinação, mais admirados, tal como belas palavras ditas pela boca de alguém já lapidado pela vida. Assim como eles, ficamos mais atraentes depois da participação em tantos espetáculos.
     E a tal panela velha que só faz comida boa...?
     Bom, a esse ponto, basta de comparações. Já temos provas suficientes pra reconhecer que o tempo é que deixa tudo melhor e serve ao propósito de permitir o acúmulo de riquezas interiores. Sejam vinhos, livros, conselhos, músicas ou temperos. Quanto mais maduras, melhores somos. 
     Então, pernáquia pra você, ô sede de juventude eterna! As rugas são meu certificado de experiência e os cabelos brancos, as batutas dessa banda que eu chamo vida. É para essas marcas que quero me olhar muitas vezes no espelho e reconhecer a bruxa velha em meu coração.


quarta-feira, 16 de maio de 2018

                      QUEM FOI UM DOS SEUS OITO BISAVÔS?


Sempre fui adepta de terapias alternativas para tratamento de males físicos, mas em certa ocasião o que obtive de uma consulta a um velho quiropata foi uma bela lição de vida.
Em meio à agonia de estralos nas vértebras do meu corpo, o senhor barbudo inicia uma conversa querendo demonstrar que meu corpo tenso registrava um estresse inútil decorrente de acontecimentos banais e sem importância. Falou o quanto são desnecessárias as tristezas, especialmente aquelas causadas por problemas pequenos, além do desperdício de energia frente a tantos medos, desgostos e o mais que o ser humano ainda não aprendeu a lidar.
   - O nome de um dos meus oito bisavôs? Como assim? Perguntei. Não estava entendendo aonde queria chegar aquele homem com aquela pergunta que me obrigava a montar rapidamente na cabeça a árvore genealógica da família. 
   E continuou: - Isso mesmo... como era o nome dele (de um bisavô seu)? Onde morava? Com o que trabalhava? O que o deixava feliz ou triste? Morrera do quê? Onde está enterrado? O que você sabe sobre ele?
   Pareciam "curiosidades" sem sentido, pois minha resposta a todas essas indagações foi "não sei". Aliás, não sei absolutamente nada, eu completei, ainda sem entender a lição que estava prestes a aprender com todo aquele diálogo.
   Veio então a moral da história arrematada pelo senhor quebra ossos: - Viu só! Bastam três gerações para que você seja completamente esquecido. Portanto, pra que serve tanto sofrimento, melancolias, rancores, aflições, enfim toda aquela gama de sentimentos inúteis que consomem tempo e vitalidade?
   - É mesmo! Suspirei profundamente em atitude de imediata concordância. Foi como se uma luz tivesse acendido em minha cabeça. Aquilo foi o click para a mudança de mentalidade a respeito dos propósitos que eu acabava de fazer para não perder mais um único segundo da vida com bobagens. Transformei aquele diálogo em cartilha pra focar apenas no lado bom das coisas, aproveitar os momentos efêmeros e dar um chega prá lá nos pensamentos destrutivos.
   Se meus futuros bisnetos sequer saberão como era meu nome, realmente, não há razão pra me consumir por causa de fechadas no trânsito, louças que se quebram, caras feias quaisquer. Melhor deixar aos descendentes o legado da alegria e do bem viver para que, ao menos, se lembrem que tive uma vida prazerosa, e que usei meu tempo nessa Terra pra distribuir sorrisos e lições positivas.
   Preocupação com coisa pouca nunca será escrita em testamento, não tornará ninguém inesquecível, nem fará história. Útil mesmo é ser feliz.