quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O CORAÇÃO E OS CACHORROS


     Por ocasião de uma cirurgia cardíaca na minha família (bem sucedida, viva!), em meio àquela atmosfera de tanta preocupação e burocracias hospitalares, aproveitei um momento na conversa com o médico para indagar-lhe, afinal, qual vinha a ser o maior segredo para manter o coração sempre em bom funcionamento e evitar transtornos nessa área. O doutor, que já devia ter ouvido a tal pergunta mais de um milhão de vezes, deu-me imediata resposta, mais graciosa do que técnica: "Evitar doce e não sentir raiva". Xiii, e agora? Não há quem nunca tenha sucumbido a delícias açucaradas ou se corroído vez ou outra com o dito sentimento maléfico. Que recomendação difícil de cumprir...
      Fiquei pensando que em muitos momentos só um brigadeiro cumpre a função de neutralizar a ira, que chega com força nas ocasiões em que o controle interno falha. Arrisco dizer que doce e raiva vivem juntos, são complementares, como os lados da mesma moeda, inseparáveis. Jamais vi alguém que só consiga se acalmar com um empadão de ricota. Mas se assim for, então paciência! O negócio é reforçar a reza pra que nada aconteça. Ficar sem doce ou se contentar com tudo à sua volta, no fundo, parece coisa pra cachorro. Só eles comem a mesma ração todos os dias e se sacodem de alegria o tempo todo. Podem viver bastante, quando bem cuidados, mas jamais saberão que gosto tem um bombom, nem mudarão o rumo de suas vidas após situações adversas ou acusações injustas.
      De todo modo, meu nobre e querido músculo que me desculpe pelos deslizes que até hoje cometi. Prometo daqui pra frente não lhe obrigar a novos apuros. Vou sim me comportar à mesa e sentir a vida com mais amor.
O CORAÇÃO E OS CACHORROS


     Por ocasião de uma cirurgia cardíaca na minha família (bem sucedida, viva!), em meio àquela atmosfera de tanta preocupação e burocracias hospitalares, aproveitei um momento na conversa com o médico para indagar-lhe, afinal, qual vinha a ser o maior segredo para manter o coração sempre em bom funcionamento e evitar transtornos nessa área. O doutor, que já devia ter ouvido a tal pergunta mais de um milhão de vezes, deu-me imediata resposta, mais graciosa do que técnica: "Evitar doce e não sentir raiva". Xiii, e agora? Não há quem nunca tenha sucumbido a delícias açucaradas ou se corroído vez ou outra com o dito sentimento maléfico. Que recomendação difícil de cumprir...
      Fiquei pensando que em muitos momentos só um brigadeiro cumpre a função de neutralizar a ira, que chega com força nas ocasiões em que o controle interno falha. Arrisco dizer que doce e raiva vivem juntos, são complementares, como os lados da mesma moeda, inseparáveis. Jamais vi alguém que só consiga se acalmar com um empadão de ricota. Se assim for, então paciência! O negócio é reforçar a reza pra que nada aconteça. Ficar sem doce ou se contentar com tudo à sua volta, no fundo, parece coisa pra cachorro. Só eles comem a mesma ração todos os dias e se sacodem de alegria o tempo todo. Podem viver bastante, quando bem cuidados, mas jamais saberão que gosto tem um bombom, nem mudarão o rumo de suas vidas após situações adversas ou acusações injustas.
      De todo modo, meu nobre e querido músculo que me desculpe pelos deslizes que até hoje cometi. Prometo daqui pra frente não lhe obrigar a novos apuros. Vou sim me comportar à mesa e sentir a vida com mais amor.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

SÁBIAS PALAVRAS

     Meu avô paterno era um cara muito bem humorado que conseguia fazer piadas escancaradas com ar de filósofo sério. Falava coisas do tipo "relógio que atrasa não adianta", ou então "não bebo mais... e nem menos", agarrando-se logo a um trago que lhe oferecessem. Na sua lápide - dissera - haveria de constar a frase "aqui jazem meus ossos, queria que fossem vossos". Mas a melhor mesmo era dita em tom de verdade jamais percebida: "é bem melhor ser rico e com saúde do que pobre e doente". Sabia deixar o interlocutor em dúvida quanto à seriedade do diálogo. Era um sábio palhaço, ou ao contrário. Morreu moço, cinquenta e poucos anos, de modo que não cheguei a conhecê-lo, mesmo assim me divirto com suas histórias, todas contadas pelo meu pai, aliás, um senhor herdeiro dessa veia cômica. Pela leveza diante da vida, consigo admirá-lo, lamentando não ter um único dia sentado em seu colo. Queira Deus eu possa também ser capaz de, ao menos, extrair sorrisos de descendentes contadores de minhas vivências, numa dessas fazendo-os gargalhar por algum deslize engraçado.
    Mas ser lembrado por uma qualidade é só o reflexo de possuí-la, pois quem de fato leva a melhor é a própria pessoa que a tem dentro de si. Vale o oposto também. Desse modo, quem é bondoso e pacífico traz a bondade e a paz no coração, assim como o raivoso e o cruel são os que primeiro experimentam raiva e crueldade, e assim por diante.  Divagações à parte, essas aí estão mais pra galhofa, tamanha obviedade em dizê-las.
   Pois é possível que a graça oculta nas falas soberbas sirvam justamente pra mostrar o óbvio que não se costuma enxergar, de vez que a gargalhada deva ter, junto com a infelicidade, o seu efeito pedagógico.  Então, se dá pra aprender com o riso, aqui vai um conselho poderoso ao estilo do velho Alfredo: é melhor rir do que chorar.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

AS TRILHAS SONORAS DA VIDA

  Tenho por costume - involuntário - associar músicas a acontecimentos da minha vida, assim como a pessoas, lugares e até a estações do ano. Desde pequena é assim, de modo que muitas canções, de todas as épocas e com quaisquer ritmos, são capazes de me remeter a todo tipo de recordação: tem melodia que leva direto às tardes da minha tenra infância e aquela que faz aparecer na cabeça toda a família reunida e em férias. Tem a que faz o morro lá da praia ficar mais próximo, e a que traz de volta pessoas que, de um jeito ou de outro, já se foram. Há também as melodias que são um pouco doídas de ouvir, e nessas horas, só mesmo o botão off para a mente - ou o coração - descansar. Boas mesmo são as que trazem alegria, seja por nos conduzirem novamente aos quinze, vinte anos de idade, seja porque dão vontade de sacudir.
      Dias atrás, no carro, liguei o rádio e praticamente deu pra fazer um bom revival. Impressionante como tantos hits naquela tarde puderam mexer comigo. Foi inevitável a viagem no tempo. Pessoas e situações variadas vieram com força e nitidez em meu pensamento, junto com uma enorme saudade. Parecia que eu folheava um álbum de fotos bem coloridas. Na verdade, trilhas sonoras têm mais poder de me levar ao passado, possivelmente pela predominância da memória auditiva.
    Então, pra garantir um futuro recheado de lembranças agradáveis, quem sabe o segredo não é conectar os sucessos atuais a boas energias? Tipo uma reserva de mercado, uma playlist que só traga lá na frente sorrisos por momentos vividos e pessoas importantes, e nos faça sair por aí dançando ...