O SILÊNCIO QUE UNE

Tempos atrás, um dia nublado me convidou a um café da tarde dentro da livraria. Pra mim, esse perfeito triângulo amoroso compõe a fórmula do prazer, da plenitude, eu diria até, do êxtase sublime insubstituível. Escolhi minha mesa, apoiando os candidatos a engordar minha biblioteca, fiz meu pedido e
de repente... nada do que planejei aconteceu. Minha atenção foi capturada pelo casal de idosos ao lado. Ele, recostado na cadeira, pernas cruzadas, tomava em golinhos lentos seu capuccino e distraía-se com o movimento geral. Ela, muito arrumada, cheia de joias, postura ereta, concentrava-se em revistas de fofoca. Durante os quarenta minutos em que ali permaneci só o que fiz foi observar os modos daquelas duas pessoas e, principalmente, sua total ausência de diálogo. Pois então, o que os teria prendido um ao outro por uma vida inteira? Quantas batalhas já teriam enfrentado juntos. Porém, não interagiam, não se olhavam, cada qual vivia no seu pequeno e efêmero universo particular. E eu ali, me transportando aos seus lugares e tentando extrair conclusões.
Que leitura, que nada! Meu divertimento foi examiná-los. Sorte que nem me viram, estavam absolutamente concentrados em seus interesses, pelo que, pude admirá-los sem medo de os incomodar.
Num dado instante e depois de paga a conta do consumo, o casalzinho se levanta e, ainda sem comunicar quaisquer palavras, dão-se as mãos e saem caminhando vagarosamente em direção à saída.
Isso é que é intimidade, pensei, compartilhar o silêncio sem obrigação de blá blá blá toda hora. Conversar é bom, debater assuntos em comum melhor ainda, mas respeitar o espaço e a individualidade de cada qual é sagrado, seja olhando o movimento em volta, seja bisbilhotando a vida dos famosos. Silêncio também é manifestação de vontade, logo, pode dizer muito. Talvez represente o diferencial entre ser feliz ou não, viver mais ou menos, ter muitas ou poucas rugas, economizar ou gastar pedidos de perdão.
Naquela tarde em que eu me programara pra aprender mais um pouco com novas leituras, quanta coisa aprendi sem ler uma linha sequer.
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