terça-feira, 8 de março de 2022

 MULHERES POR UM DIA



        Queria, por um dia só, que todos os homens soubessem o que é ser mulher.

        Experimentariam o sangue escorrendo por entre suas pernas e sentiriam cólicas parecidas com facadas, enxaquecas e ficariam surpresos com nossa alegria de viver mesmo tendo que suportar esta sina da natureza. Chorariam e teriam raiva sem saber muito bem o motivo e sentiriam em seu corpo a força aterradora dos hormônios. Perceberiam em seus corpos o potencial de uma gestação e temeriam as subsequentes e inevitáveis modificações, assim como temeriam as dores do parto e saberiam que amamentar é, antes de qualquer coisa, uma prova de fogo.

        Teriam que encontrar disposição para trabalhar, além das demandas da família e da casa. Teriam que desempenhar seus afazeres domésticos com filhos querendo seu colo e teriam que deixar para depois um rápido descanso no sofá com as pernas para cima. Os "mulheres por um dia" sentiriam o peso da obrigação social de se regozijarem com a maternidade como papel imposto como bênção inquestionável.

        Sofreriam com os padrões de beleza impostos pelas mídias sociais e entenderiam a dor de ser reduzida a um mero objeto sexual, assim como teriam medo de usar uma roupa justa ou de andar em qualquer lugar, a qualquer hora com liberdade. Saberiam o desconforto de ter que se esconder em panos para suas curvas não despertarem a fúria de machos excitados. Sentiriam a ameaça de um estupro.

        Saberiam como é ser obrigada a sentar de pernas fechadas para não serem criticados pelo seu jeito considerado pouco elegante, teriam de falar baixo ou não falar certas coisas para não serem julgados, queimados, açoitados ou até mortos. Teriam de se submeter à repressão dos seus desejos disfarçada de bons costumes sociais. Teriam vontade de esbravejar contra injustiças motivadas pela sua mera condição feminina.

        Lutariam por um espaço no mundo que já é seu, mas que foi suprimido, assim como batalhariam pela igualdade de oportunidades e direitos, porque garantidos apenas no papel. Os "mulheres por um dia" saberiam como é difícil fazer sempre o dobro ou o triplo para provar que também possuem inteligência e capacidade, assim como teriam vontade de dizer que ser doce o tempo todo, por exigência social, cansa muito. Experimentariam na pele o estigma da inferioridade. Saberiam que o mito da heroína perfeita é perturbador, porque não existe.

        Conheceriam a crueldade como lugar comum, a violência em atos e palavras. Saberiam o que é não gozar dos privilégios sociais a que os homens estão acostumados. Saberiam que força física não é poder.

        Contudo, adorariam sentir que em suas entranhas habita uma força diferente. Adorariam conseguir pensar e fazer cem coisas ao mesmo tempo. Entenderiam como bate um coração feminino e sentiriam a sensibilidade no olhar. Saberiam que as dificuldades sofridas não nos abatem, pois são combustível para a transformação. Aprenderiam estratégias sutis de avanço e recuo para conseguirem seus objetivos. Ficariam surpresos com a quantidade de ardis usados para conquistar um amor.

        Discordariam totalmente da existência de um 'sexo frágil' e reformulariam muitas de suas opiniões, bem como se arrependeriam de nunca terem se colocado antes nesse lugar, como ato de empatia para entender pelo que passa uma mulher num mundo moldado pelo masculino. Os "mulheres por um dia", apesar de nossas dores, teriam vontade de ser mulher.

        Concordariam com Simone de Beauvoir, para quem "ninguém nasce mulher, torna-se mulher" e entenderiam que se tornar mulher é um caminho difícil, ainda que muito compensador.

        Feliz dia internacional da mulher.

        




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