domingo, 27 de junho de 2021

 POUCO OU MUITO


            
             "Pouco" é uma palavra que significa insuficiência, é um advérbio de intensidade com o qual se pode brincar e dizer muito. Aliás, o "muito" é justamente o seu contrário, também é um advérbio e quer dizer bastante.

            Misturando isso tudo, dá pra usar o "pouco" e o "muito" e estabelecer vários graus de quantidade de qualquer coisa, algo como uma espécie de gradação ou de nuances. Vejamos:

             "Não pouco" remete ao "muito", da mesma forma que o "não muito" remete ao "pouco". Por exemplo, se digo que sinto "não pouco" amor por alguém, acabo expressando melhor que amo muito essa pessoa, talvez uma forma de manobrar a língua para tornar mais claro o conteúdo da mensagem. Parece até que falar do sentimento de um modo direto não exprime tão bem o que se quer dizer. Ao contrário, se eu digo que amo "não muito" certa pessoa, acabo dizendo que a amo pouco, e daí o eufemismo serve para amaciar a dureza do recado. De qualquer forma, é interessante observar estes artifícios linguísticos para modular o que se passa no coração.

             Tem também o "muito pouco", que usamos quando queremos enfatizar o pouco, assim como o "pouco muito", quando pretendemos dar ênfase ao muito. Olha só: se digo que estou "muito pouco" satisfeita com alguma coisa é porque estou pouco satisfeita; agora, se entendo que uma pessoa é um "pouco muito" insistente é porque entendo que ela devia dar uma folga pra mim. Nestes casos, o uso dos contrários ao mesmo tempo não se excluem, mas sim traduzem melhor a intenção que se quer demonstrar. Complicado ou nem tanto? Confuso, talvez, mas na prática dá pra ter uma boa ideia de tudo isso. Eu só não queria ter que explicar isso para um estrangeiro!

       Tem mais. É o caso do "pois sim", que quer dizer "não" e do "pois não", que quer dizer "sim". Fazer um pedido a alguém e receber como resposta um "pois não", significa aceitação, abertura, possibilidade. Ao contrário, receber como resposta de alguém um "pois sim",  significa um sonoro não, meio irônico até, na minha opinião. Millôr Fernandes foi quem destacou essa dualidade divertida.

       É tudo uma questão de saber quando e como usar cada uma das expressões, lembrando que o sentido literal delas é o que menos importa. Aliás, não há quase nada literal neste mundo, pois tudo é questão de interpretação e significado. Na dúvida, pra não errar, falemos pouco de muitas coisas e muito de poucas.

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