segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

 A PAIXÃO SEGUNDO GH   


        Não se preocupe, isso não é nenhum plágio do romance de Clarice Lispector, cujo título é, justamente, A paixão segundo GH. Trata-se do meu próprio testemunho a respeito do que eu entendo por paixão, pois, GH são as iniciais do meu nome de batismo: Gisele Hatschbach. E para conferir a devida autenticidade a esse texto vou começar de modo contrário, pelo oposto, isto é, dizer o que não é a paixão, segundo a minha pessoa.

        Assim, de acordo com o meu entendimento, paixão não é som, paz ou calor. Tampouco é marola de praia, brisa ou terra plana. Paixão não é círculo, linha reta ou conta perfeita. Não creio ainda que seja acordo, permissão ou passe livre. Paixão pode ser tudo, menos brincadeira, sorriso ou encaixe perfeito. Não é pano de fundo, música ambiente ou aperitivo. Paixão não é família, amigo ou encontro. Não é sonho, nem manhã ou noitinha. Paixão não é silêncio ou cochicho. Também não é mão no bolso, tons pastéis ou rasteirinha. Não é segurança, corda ou sinal verde. Paixão não é pijama, saia comprida, casaco ou guarda-chuva. Não é bem estar. Não é relógio preciso. Paixão não é cantiga cantarolada, não é pecado, não é acaso. Não é sol do meio dia nem dia nublado. A paixão não é um monte de coisas.

        A paixão, segundo GH, me parece ser tudo isso ao contrário, do avesso, intenso. Então é barulho, confusão, fogo incandescente, que grita, cansa, queima. É onda grande do oceano, vendaval, cordilheira. É o triângulo pontiagudo, a linha torta, a dízima periódica. Paixão é o desacerto, o não, a entrada proibida. É coisa séria, que machuca, derruba lágrima, não encaixa. É protagonista, orquestra, prato principal. Paixão é desejo oculto, pesadelo, madrugada. É música, banda, algazarra. É mão estendida, convite. Paixão é batom vermelho, lantejoulas, salto alto. É perigo, sinal fechado, voo livre no abismo. É nudez, lenço no pescoço, perfume, tempestade que enxarca. Paixão é dor de barriga. É ampulheta, é ópera em teatro municipal. Paixão é divino. É crepúsculo rosado, noite estrelada. Então, a paixão pode ser também um monte de outras coisas.

        A verdade é que a tentativa de dizer o que é ou o que não é a paixão chega a ser inútil. Tudo não passará de uma grande brincadeira. Posso afirmar que não entendo quem perde tempo descrevendo a paixão de forma comum. Entendo menos ainda quem acredita que consegue, porque a paixão, segundo o que eu penso, não é sequer desse mundo, logo, não há palavra compatível ou dialeto adequado para exprimir o seu sentido. Então eu só digo o que me dá vontade de dizer o que é e o que não é essa tal de paixão. Talvez suspiros, rubores, acelerações cardíacas e pupilas dilatadas sejam mais capazes, porque conseguem aproximar os apaixonados das explicações para o que sentem.

        A paixão, segundo eu, pode ser (ou não) o que eu quiser, o que eu inventar, menos o que eu consigo dizer dela, porque paixão não se descreve. Paixão a gente sente, paixão nos domina, paixão toma conta de nós.

        

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