O BENEFÍCIO DA DÚVIDA
A dúvida, mais conhecida como a falta de certeza, é uma constante na vida de qualquer pessoa. Existe em qualquer alma humana que habita ou já habitou este planeta, assim como já está à espera das que ainda virão. A dúvida está em todos os lugares e em todos os tempos. É mesmo uma grande questão, como expressou Hamlet com o 'ser ou não ser' nascido da pena de Shakespeare nos idos anos do século XVII.
Mas não é de todo ruim a dúvida. Chego ao ponto de pensar que devíamos acolhê-la como parte indissociável de nós e reverenciá-la em vista da sua utilidade muitas vezes ignorada. No fundo a dúvida é nossa amiga, protege-nos em muitas situações. O seu oposto sim é que é nefasto: a certeza.
Primeiro, porque funciona como uma espécie de vírus psíquico que passeia pelo nosso cérebro atingindo o coração e gerando outros estragos secundários. Tem muita gente doente dessa fraqueza. Engana-se quem acredita que a certeza é valiosa, algo para ser almejado.
Segundo, porque a certeza sequer existe, posto que é efeito de uma distorção do pensamento de quem diz possuí-la. É uma fantasia maléfica que promove julgamentos rasos, tem efeito redutor de tudo, interrompe progressos em vários campos, enfim, a certeza é péssima. A certeza é tão maléfica que a sua ausência chega a provocar uma necessidade de inventá-la para dar sustentação a crenças cristalizadas.
A expressão 'benefício da dúvida', como popularmente se diz, confirma que a dúvida é mesmo benéfica, pena que ninguém presta muita atenção na sua utilidade. Precisa-se ser acusado de algum comportamento indevido para o indivíduo lançar mão da dúvida como escudo de proteção na hora de um empurrão contra o muro das cobranças.
Basta também ser destinatário da denúncia de uma transgressão qualquer para que se peça socorro ao 'benefício da dúvida' para escapar da condenação. Daí sim a dúvida é maravilhosa e todo mundo tira ela da manga para se ver absolvido. No mais das vezes, todo mundo quer é ser visto como o grande porto onde a certeza aterrissa.
Dúvida, meu povo, é prima irmã da liberdade! É o 'só sei que nada sei' de Sócrates, o puro reconhecimento da falibilidade humana. A dúvida é o portal das mil e uma possibilidades. A certeza que é a vilã, porque reside no bueiro onde convivem a cegueira e a estupidez.
Ninguém é menos porque tem dúvida. Fazer as pazes com a dúvida é como sair da vala comum das infalibilidades humanas, este lugar tão sem luz, onde nada é maleável e tudo é endurecido e provisório, o esconderijo onde as certezas brigam entre si para se sobressaírem.
Fonte da imagem: https://tomgreentree.com/when-doubts-assail-how-faith-can-grow-when-doubts-come-knocking/

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